Sábado, dia 19 de Setembro, a dois dias do ínicio das aulas. Ok, não seriam bem aulas, mas uma espécie de curso de integração ao francês para alunos de Erasmus, que duraria duas semanas. Só tínhamos essa informação e de que esse curso seria dado na nossa futura universidade: Université de Vincennes Saint-Denis. Muitas questões com o plano de estudos ainda teriam de ser resolvidos lá, mas...Não tínhamos alojamento...E essa era o grande problema primário para nós, mas aos poucos íamos vendo que a falta de habitação é o maior problema da cidade de Paris.
Quando se tem um problema, tenta-se solucionar de qualquer forma, e quase sempre sem pensar duas vezes. Costuma sair asneira, já lá vamos...
Acordámos outra vez muito cedinho, não para contemplar o nevoeiro do segundo dia em Paris, mas para nos dirigirmos ao Posto de Turismo na Boulevard de Rochechouart, muito próximo do Woodstock (o hotel onde ficámos a primeira noite... por motivos pseudo-técnicos não vamos dizer onde ficámos a segunda noite). É uma Boulevard, que liga outras duas, a de Clichy e a de La Chapelle, formando uma via muito importante em termos turísticos (Moulin Rouge, Sacré Coeur...).
Mas era tão cedo que o posto de turismo ainda não estava aberto...Mas para quê o posto de turismo? Saber onde ficava uma agência de alojamento, chamada de Hestia (www.hestia.fr/), anunciada na internet como a 'número 1' nos serviços imobiliários para estudantes, bla, bla bla...
Depois da fila de turistas italianos ter sido atendida, lá fomos nós de sacos e mochilas atrás perguntar onde ficava a tão estranha agência para a funcionária. E imaginem, fica perto de Porte Maillot, o local da nossa chegada, ou seja toca a ir a pé (uma viagem de metro fica por €1.60, não compensa, pensávamos nós), outra vez pelo mesmo percurso, e outra vez com os sacos. Mas tinha de valer a pena, era só a agência 'número 1' d...
Quando chegámos, a burocracia do costume (costume português pelo menos), um grupo de jovens na mesma situação que nós, e uma taxa de inscrição de 160 €!!!!! Inscrição essa que dava direito a ter acesso aos contactos dos proprietários de estúdios que nos poderiam interessar, exacto, 'poderiam' interessar, tal como 'poderiam' nem sequer estarem livres...Nem um rebuçado ou vale de compras a inscrição dava direito...
A simpatia do rapaz que nos atendeu (falava inglês, uau!) e o desespero fazem maravilhas!
Mas o resultado ainda é melhor, o único proprietário que nos atendeu e tinha o estúdio ainda por alugar, não aceitava estudantes com os pais a morarem fora de França!...
...VIVA o preconceito francês! Nas famílias francesas de Au Pair, não aceitam rapazes, e para alugar estúdios, não só já exigem cauções exageradas como ainda há quem exiga que os pagadores estejam a viver em França...
A desconfiança por rapazes a tomarem conta de crianças é completamente rídicula, já a desconfiança em relação ao resto até se percebe, mas não num país como a França...
Arranjar alojamento em Saint-Denis começava a ser um horizonte possível.
Saint-Denis é uma região, melhor dizendo, uma cidade nos subúrbios de Paris (o 'banlieue'), onde fica a nossa futura universidade. Infelizmente a procura por alojamentos 'dentro' de Paris deveu-se em muito a uma quantidade significativa de pessoas que em Portugal nos disseram que Saint-Denis era 'do pior'! Tão 'do pior' que até a Wikipédia fazia o favor de dizer que era a região com mais criminalidade da Île-de-France.
A île-de-France é uma das províncias em que se divide a França, e que inclui Paris (não falando da regionalização, e porque 'província' é tão prejorativo, é como a Estremadura incluir Lisboa)...
Pelo menos duma coisa tínhamos certeza, o alojamento fora do centro de Paris é bem mais barato. E talvez não perderíamos muito em tentar a sorte lá. Senão arranjássemos no fim de semana algo por Paris, íriamos na segunda-feira para a Universidade a piscar o olho a anúncios.
Já era de tarde, estávamos estafados, calor considerável, mas antes de decidir mais alguma coisa em relação a onde ficar essa noite, fomos tratar de comprar um cartão de telemóvel francês, já que nos esperariam muitas chamadas por fazer:
- Bonjour, J' appelle à cause de l'annonce...
Numa Fnac que é um autêntico centro comercial, comprar o cartão foi uma autêntica confusão. Se já é difícil falar uma língua em que se mistura inglês, francês e português (quando não se sabe o que dizer nas outras duas), o processo de aquisição não ajuda.
Mas bem, à medida que íamos 'vivendo' em Paris, íamos nos dando conta de novas soluções e de novas informações que nos ajudavam a safar-nos nesta imensa cidade.
As horas iam passando e o único sítio para ficar essa noite que nos vinha à cabeça era o Woodstock, então, toca a voltar para lá, mas como era cedo e a Boulevard de Courcelles já tava 'mais que batida' (ah pois! Damo-nos ao luxo de o dizer!), fomos pelos Champs Elysées (Campos Elísios pronto...). Não temos fotos desta avenida que é uma das mais largas e belas do mundo - aliás na altura que a estávamos a 'descer' nem fazíamos ideia de como se chamava -, mas fica a promessa de lá voltarmos como 'turistas'.
Fomos subindo pela luxuosos quarteirões que dariam à Place de Clichy, e os nossos ouvidos formados no meio da boa cuscubelhice tuga (é assim que se escreve?), permitiram-nos ouvir uma conversa entre duas senhoras portuguesas, e claro, só havia uma coisa a fazer: chatear uma delas.
A senhora era simpática, e apercebemo-nos que ela já era imigrante há muito tempo, ou não fizesse questão de dizer várias vezes que para irmos ter ao café português mais próximo bastava 'montar' a rua.
De qualquer das formas ficou com o nosso número para ver se nos arranjava um quartito onde ficar.
Etapa seguinte: ir ao café português, 'O Sopas', estabelecimento com requinte parisiense mas com autocolantes da Sagres a patrocinar a selecção bem visíveis. Metemos conversa com os nossos 'irmãos' e arranjámos mais contactos para possíveis estúdios. Acabariam por não servir para nada, mas pelo menos já tínhamos um sítio onde ver os jogos de futebol!
Antes de regressar ao Woodstock, destaque para o saco da Vânia, que oportunamente fez questão de rasgar...ah benditas lojas de indianos, sim porque aqui, lojas de chineses só na Chinatown...